As
transações imobiliárias estão intimamente ligadas ao desenvolvimento urbano e
estão em constante crescimento. De acordo com o informe do Registro de Imóveis
do Brasil, divulgado em parceria com a FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas) sobre dados relativos às operações imobiliárias no Brasil, apenas
em São Paulo foram registradas 280.720 transferências imobiliárias em 2023, no
Rio de Janeiro foram 88.487 e Curitiba foram 56.619 transferências no mesmo
ano.
Pensando
nisso, com o intuito de trazer maior segurança jurídica para aqueles que
realizam transações imobiliárias, e resguardar os interesses de terceiro de
boa-fé, foi sancionada a Lei 14.825/24, a qual entrou em vigor em março de
2024.
Privilegiando
o princípio da boa-fé como norteador das relações jurídicas, a citada Lei
acrescentou o inciso V ao caput do artigo 54 da Lei nº
13.097/15, para garantir a eficácia dos negócios jurídicos relativos a imóveis
em cuja matrícula inexista averbação, mediante decisão judicial, de qualquer
tipo de constrição judicial.
A
partir da entrada em vigor da lei, caso não tenha sido registrado ou averbado
na matrícula do imóvel, por meio de decisão judicial, qualquer tipo de
constrição judicial incidente sobre o imóvel ou o patrimônio do proprietário,
inclusive aquelas resultantes de improbidade administrativa ou de hipoteca
judiciária, em tese os negócios jurídicos que tenham por objetivo constituir,
transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis serão considerados válidos
e eficazes em relação a atos jurídicos precedentes.
O
cuidado com a proteção ao adquirente de boa-fé contra fraudes na execução não é
novidade para o Poder Judiciário. Conforme entendimento pacificado pelo
Superior Tribunal de Justiça na Súmula nº 375, “o reconhecimento da fraude à
execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do
terceiro adquirente”.
Com
isso, a legislação e o Poder Judiciário se alinham sobre a concentração dos
atos processuais na matrícula do imóvel, o que viabiliza a identificação de
riscos antes da conclusão do negócio jurídico, traz maior transparência e
segurança, bem como diminui a burocracia e necessidade de consulta de inúmeros
cartórios judiciais e extrajudiciais para verificar eventuais casos de
anulação.
Assim,
ao proporcionar maior segurança e redução de burocracia, a legislação soma à
melhora do ambiente de negócios e, por consequência, ao desenvolvimento urbano.
Tal condição, porém, não deve ser interpretada de forma absoluta. Caso o
terceiro tenha conhecimento da situação jurídica não registrada na matrícula,
poderá ser declarada a ineficácia do ato. Isso ocorre porque a lei busca
proteger apenas o terceiro de boa-fé, ou seja, aquele que adquire o imóvel sem
saber de circunstâncias que poderiam invalidar a transação no futuro.
Diante
disso, apesar de a Lei 14.825/24 representar grande avanço normativo para
privilegiar o princípio da boa-fé como norteador das relações jurídicas, as
partes precisam ter cautela nas transações imobiliárias, especialmente sobre a
má-fé de terceiro conhecedor de uma eventual constrição, a qual é crucial para
garantir que a legislação alcance seu objetivo de promover segurança jurídica
às transações imobiliárias. Portanto, não se deve abandonar a pesquisa em
nome do vendedor, com obtenção das certidões pertinentes.
Ana
Paula de Carvalho - advogada no escritório Alceu, Machado Sperb & Bonat Cordeiro
Advocacia nas áreas do Direito Societário e Contratos Empresariais.