Devido ao momento de pandemia que assola o país, realizar uma assembleia com aglomeração de pessoas é inviável
É fato notório e público, que dispensa prova, a existência da pandemia (COVID-19) que está paralisando o mundo.
Conforme comunicado, a Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC) indicam às administradoras de condomínio que orientem síndicos a adiar a convocação de assembleias ou reuniões presenciais, atendendo aos alertas emitidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e pelo Ministério e Secretarias de Saúde para cancelamento de eventos com aglomerações de pessoas como medidas restritivas.
A Ordem dos Advogados de São Paulo de São Paulo, da mesma forma, emitiu no dia 16 de março de 2020, nota orientando também pela suspensão das assembleias de condomínios.
A questão da fácil contaminação e o índice de mortalidade desse novo vírus são alarmantes. Sendo assim, toda e qualquer assembleia deve ser suspensa de imediato, por responsabilidade e bom senso daqueles que a convocaram.
Segundo o art. 1.350 do novo Código Civil haverá, anualmente, uma assembleia geral ordinária que tratará da discussão e aprovação dos temas seguintes: prestação de contas; previsão orçamentária; eventualmente: eleição do síndico ou alteração do regimento interno. Já as assembleias gerais extraordinárias serão realizadas quantas vezes forem necessárias, segundo o entendimento do síndico ou de ¼ dos condôminos quites.
Porém, síndicos têm nos consultado sobre encerramento do período de mandato, e por consequência possíveis problemas junto à instituição financeira onde o condomínio possui conta bancária.
Em um dos condomínios, uma candidata da oposição se insurgiu contra a decisão do síndico de suspender a assembleia que trataria entre outros assuntos da eleição do novo síndico ou mesmo da reeleição do atual. Vejam vocês, mesmo diante do grande risco de contágio do vírus algumas pessoas ainda continuam pensando no próprio umbigo. Mas depois de uma suspeita de contágio de uma das moradoras, a candidata aceitou a suspensão da assembleia.
No outro caso, o Conselho Fiscal não concordou com a decisão do síndico de trocar a administradora e correu para obtenção de 1/4 (um quatro) de assinaturas para chamar assembleia e tratar da destituição do síndico. Mesmo com os apelos do síndico em relação ao risco de contágio, o grupo que pretendia a destituição encaminhou mensagem para todos que assinaram o abaixo-assinado com o seguinte texto:
“Boa tarde Condôminos. Temos uma assembleia marcada, e com manifestações de alguns moradores e dos conselheiros resolvemos mantê-la. Estamos cientes dos fatos e riscos em relação ao Corona Vírus e sabemos também da necessidade do nosso condomínio em ter essa assembleia. Por isso viemos pedir a colaboração e compreensão de todos – não cumprimentar as pessoas com aperto de mão, beijo no rosto e falar o mais distante possível – não levar acompanhantes ou crianças. Se o marido for, não ir a esposa ou o contrário – sentar distantes. A assembleia será ao ar livre, mas mesmo assim corremos riscos. A orientação geral é cancelar. Mas é uma orientação. Assumir os riscos e as responsabilidades sobre nossos atos. Atenciosamente Conselho”.
Para esse grupo de moradores vale mais correr o risco de contágio do que suspender a assembleia. Diante disso o sínico foi obrigado a ingressar com ação judicial para suspender a realização da assembleia. Mais uma vez o interesse de um pequeno grupo queria ficar acima de toda coletividade.
Mas então, como fica o mandato de um síndico que encerrou ou está prestes a encerrar?
Em uma análise rápida fica prorrogado por tempo indeterminado (é a chamada prorrogação tácita) até que a cidade e o país superem a pandemia desse terrível vírus. Afinal de contas, a vida em condomínio prossegue e os lares passam a ser o local de isolamento das pessoas. Mas para isso a portaria, segurança, limpeza e todas as outras despesas básicas essenciais para a manutenção da edificação precisam ser pagas, e o síndico precisa aprovar os pagamentos, geralmente através de uma instituição bancária.
Por outro lado, já foi divulgado por uma grande instituição bancária que a “prorrogação da procuração por 90 dias será aceita somente para os casos onde a convenção de condomínio prevê a possibilidade de reeleição”.
O art. 1.347 do novo Código Civil não estabelece qualquer limitação quanto à reeleição do síndico, num condomínio edilício. Pelo contrário, o mandato, ainda que limitado no seu prazo a 2 (dois) anos no máximo, poderá se renovar por infinitas e sucessivas reeleições.
Trata-se de um cenário perigoso, pois se considerarmos as orientações para adiar a convocação de assembleias ou reuniões presenciais, atendendo aos alertas emitidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como ficará o pagamento das despesas para manutenção da edificação?
Sabemos o quanto é difícil uma disputa judicial com os bancos. Mas desde já precisamos adotar algumas medidas preventivas. O condomínio pode seguir o prazo de término de mandato e convocar a assembleia, pelo menos emitir o edital, enviar por e-mail e em seguida suspender em razão dos riscos do Covid-19.
Dessa forma o condomínio terá uma prova (caso precise ingressar com processo judicial) que tentou realizar assembleia para eleger ou reeleger o síndico, isso servirá caso o banco bloqueie o acesso da conta bancária pelo síndico e impeça o pagamento das contas.
Mas segundo entendimento da jurisprudência devemos fazer valer a prorrogação tácita do mandato do síndico.
Também devemos fazer o possível e o impossível para esclarecer aos bancos que o mandato de um síndico pode ser ratificado por uma reeleição. E também que um novo síndico pode assumir nos casos de renúncia, problema de saúde ou mesmo quando o atual sínico não tem interesse em ser reeleito.
Temos que acreditar que os bancos terão bom senso antes de adotar qualquer medida que impossibilite os condomínios de acessarem suas contas bancária, mas claro, toda cautela será necessária.
Até porque o Judiciário já tratou de questões semelhantes no que se refere a prorrogação tácita do mandato de síndico.
“ELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. DESPESAS CONDOMINIAIS. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. OMISSÃO DO JUIZ A QUO. INEXISTÊNCIA. DENUNCIAÇÃO À LIDE. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. IRREGULARIDADE DA REPRESENTAÇÃO LEGAL DO CONDOMÍNIO. INEXISTÊNCIA. MANDATO DO SÍNDICO. PRORROGAÇÃO TÁCITA. TAXA CONDOMINIAL. PAGAMENTO. CONDÔMINO PROPRIETÁRIO OU POSSUIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Inexiste cerceamento de defesa, se o pedido de denunciação da lide foi de alguma forma apreciado pelo juiz a quo e somente não surtiu efeito pela ausência de cumprimento dos requisitos necessários à sua admissibilidade, em observância ao art. 125 do Código de Processo Civil. Preliminar rejeitada. 2. Na ausência de assembléia para eleição de novo representante do condomínio, há prorrogação tácita do mandato do síndico, até que outro seja eleito para o cargo, porquanto o condomínio não pode ficar acéfalo. 3. O adquirente do imóvel responde pelas taxas de condomínio devidas pelo alienante, em razão de sua natureza propter rem, ex vi art. 1.345 do Código Civil. 4. Seja na condição de possuidor ou de proprietário do imóvel, ao Apelante remanesce a obrigação pelo pagamento das obrigações decorrentes da relação condominial (art. 1.336, I, Código Civil), sem prejuízo da ação de regresso. 5. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA”.
(TJ-DF 20150710225533 DF 0022063-07.2015.8.07.0007, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 06/09/2017, 4ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/09/2017 . Pág.: 188/202
Essa situação de urgência possibilita que o mandato seja prorrogado de forma tácita.
CONDOMÍNIO. MANDATO DO SÍNDICO. PRORROGAÇÃO TÁCITA. CUMULAÇÃO IMPLÍCITA. ART. 290 DO CPC. OBRIGAÇÕES PERIÓDICAS. INCLUSÃO. PARCELAS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NA AUSÊNCIA DE ASSEMBLÉIA PARA ELEIÇÃO DE NOVO REPRESENTANTE DO CONDOMÍNIO, HÁ PRORROGAÇÃO TÁCITA DO MANDATO DO SÍNDICO, ATÉ QUE OUTRO SEJA ELEITO PARA O CARGO, PORQUANTO O CONDOMÍNIO NÃO PODE FICAR ACÉFALO. A REGRA DA CUMULAÇÃO IMPLÍCITA, CONSTANTE DO ART. 290 DO CPC, DETERMINA QUE, TRATANDO-SE DE OBRIGAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO, DEVE-SE CONSIDERÁ-LAS INCLUÍDAS NO PEDIDO, INDEPENDENTE DE DECLARAÇÃO EXPRESSA DO AUTOR. O OBJETIVO DO INSTITUTO É EVITAR A MULTIPLICAÇÃO DE DEMANDAS, PRIMANDO PELO PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL. AS PENALIDADES PREVISTAS NO ART. 17 DO CPC SOMENTE SÃO APLICADAS QUANDO RESTAR PATENTE PROVA NO SENTIDO DE QUE A P ARTE AGIU NOS MOLDES DO ART. 16 DO ALUDIDO CODEX. NÃO HAVENDO QUALQUER PROVA NESSE SENTIDO, NÃO HÁ DE SE FALAR EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
(TJ-DF – APL: 11140620088070007 DF 0001114-06.2008.807.0007, Relator: ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, Data de Julgamento: 17/06/2009, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/07/2009, DJ-e Pág. 105)
São inúmeros os julgados nesse sentido.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – COBRANÇA (DESPESAS CONDOMINIAIS) – REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL DO CONDOMÍNIO – SÍNDICO – AUSÊNCIA DE NOVA ELEIÇÃO -PRORROGAÇÃO DO MANDATO DO SÍNDICO EM EXERCÍCIO – À falta de nova eleição, tem-se por prorrogado o mandato do síndico em exercício, o qual legitima-se para outorga de mandato ‘ad judicia’ -Precedentes – Agravo não provido .
1 TJSP – 34ª Câmara de Direito Privado Agravo de Instrumento nº 2239225-87.2015.8.26.0000 Rel. Des. Antonio Tadeu Otoni J. 27/01/2016
Devemos seguir nessa linha de prorrogação tácita, afinal de contas as suspensões que estamos presenciando, através do Governo, para shopping, alguns tipos de comércio e escolas são por prazo indeterminado.
Escrito por:
Fernando Augusto Zito – O Autor é Advogado militante na área de Direito Civil; Especialista em Direito Condominial; Pós-Graduado em Direito Tributário pela PUC/SP; Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP; Membro da Comissão de Condomínios do Ibradim, Palestrante especializado no tema Direito Condominial; Colunista do site especializado Sindiconet e Sindiconews e das revistas “Em Condomínios” e ”Viva o Condomínio”.