(Após publicação da Lei n.
13.979 de 06 de fevereiro de 2020 - Lei do surto de coronavirus)
Por Sabrina Soares Piau,
advogada, OAB-DF 41.979.
O
presente artigo busca instruir empregados e empregadores, de forma prática e
objetiva, acerca das medidas possíveis para manutenção dos contratos de
trabalho em tempos de crise epidêmica.
1 – Faltas justificadas ao
trabalho
Sempre
existiu a possibilidade de faltas justificadas ao trabalho, previstas no artigo
473 da CLT.
No
caso da pandemia, algumas considerações são importantes nesse momento. A Lei n.
13979/2020 (Lei da pandemia) trouxe algumas definições:
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas,
entre outras, as seguintes medidas:
§ 3º Será considerado falta justificada ao serviço público ou à
atividade laboral privada o período de ausência decorrente das medidas
previstas neste artigo.
§ 4º As pessoas deverão sujeitar-se ao
cumprimento das medidas previstas neste artigo, e o descumprimento delas
acarretará responsabilização, nos termos previstos em lei.
Nesses
dois casos (isolamento e quarentena) a falta é justificada, ou seja,
interrupção do contrato de trabalho. Na interrupção do contrato a remuneração
permanece sob encargo do empregador (ressalvada licença pelo INSS), bem como a
contagem de tempo de serviço.
O isolamento
se aplica ao empregado já contaminado, por 15 dias, prorrogável por mais 15. Nesses
casos a interpretação é de pagamento dos primeiros 15 dias pelo empregador e,
se prorrogado, a partir daí pago pelo INSS.
Já
na situação de quarentena, onde corre-se o risco daquele empregado ter sido
contaminado, ele será isolado por até 40 dias. Nessa situação o empregador terá
que arcar com todo o afastamento, é o caso de risco da atividade econômica.
Outras
medidas podem ser tomadas por negociação coletiva, como férias coletivas,
compensação do período, redução da remuneração proporcional a redução de
jornada, até mesmo a suspensão temporária dos contratos de trabalho para manter
os postos de trabalho, evitando demissões.
2 – Não comparecimento
injustificado ao trabalho
Não
se enquadrando nos casos justificados de quarentena e afastamento de
infectados, o empregado que faltar ao trabalho sem a devida justificativa
formal, produzirá o desconto dos dias de falta no salário, perda do repouso
semanal remunerado e desconto nas próximas férias.
O
artigo 130 da CLT determina que até 5 faltas o empregado perderá apenas o
repouso semanal remunerado, entre 6 e 14 faltas terá 24 dias de férias,
reduzindo ainda mais as férias à medida que aumentam as faltas.
As
faltas injustificadas somente serão reconhecidas como abandono de emprego se
perdurarem durante 30 dias consecutivos, podendo ensejar uma dispensa por justa
causa.
3 – Teletrabalho (trabalho
em domicílio)
A
reforma trabalhista (Lei n. 13.467/2017) trouxe como inovação a previsão do
regime de teletrabalho no artigo 75-A e seguintes da CLT.
Antes
não prevista em nossa legislação, segundo a Organização Internacional do
Trabalho (OIT) o teletrabalho significa “a
forma de trabalho realizada em lugar distante do escritório e/ou centro de
produção, que permita a separação física e que implique o uso de uma nova
tecnologia facilitadora da comunicação”.
Portanto,
teletrabalho nada mais é que o trabalho realizado em local distinto do ambiente de
trabalho, implicando em utilização de tecnologias facilitadoras da comunicação,
que por sua natureza não constituem trabalho externo.
Em
condições normais, esse regime necessita de um aditivo contratual por escrito prevendo
as despesas que a empresa irá arcar, com um período de transição de 15 dias,
desde que haja aceitação do empregado.
Diante
da pandemia, em respeito ao interesse público, as exigências formais podem vir
a ser relativizadas, em nome do bem público, sendo os 15 dias de transição e a
formalidade contratual dispensados, em atendimento ao artigo 8 da CLT, segundo
o qual nenhum interesse de classe ou individual irá prevalecer sobre o
interesse público.
4 – Concessão de férias
As férias
individuais (seja a pedido do empregado ou empregador) são uma boa alternativa
nesse momento, já que atende a necessidade do empregado, não gera ônus maior a
empresa de arcar com esse salário sem a correspondente contraprestação do
trabalho daquele empregado, o que por consequência pode amenizar as demissões
nesse período.
No
caso de empresas de médio e grande porte, a concessão de férias coletivas são
uma boa alternativa. De acordo com a reforma trabalhista, em condições normais,
essa não necessita negociação coletiva, mas a lei exige 15 dias de pré-aviso,
com aviso em mural de funcionários, bem como comunicação ao sindicato e à
fiscalização trabalhista.
No
quadro epidêmico atual, esse prazo também poderá ser mitigado, todavia,
correndo risco do empregado questionar judicialmente no futuro, porém
justificado diante das medidas gerais que estão sendo tomadas pelo interesse
público, até mesmo para se manter os postos de trabalho.
Sob
esse aspecto, para dar maior segurança à empresa, a concessão de férias
coletivas por negociação perante o sindicato dará maior segurança ao
empregador.
5 – Saldo de banco de horas
Em
empresas de médio e grande porte que se utilizam de Banco de horas já
instituído, caso haja saldo de banco de horas, este pode ser utilizado. Caso
não haja regime compensatório instituído, pode ser instaurado agora, com prazo
de 6 meses por exemplo, para esse momento crítico.
Verifica-se
a possibilidade de celebração até mesmo individual, direto com o empregado,
desde que por escrito, de até 6 meses.
Pode
ser utilizado saldo negativo também, onde será concedida folga aos empregados
agora e tais horas serão contabilizadas para utilização posterior, com reposição
de 02 horas extras diárias sem custo adicional para utilizar esse saldo, não
excedendo 10 horas diárias de labor.
6 – Redução de jornada e salários
de forma proporcional
Em contrapartida
de garantia e proteção do emprego, embora proibido pela Constituição da
República, a reforma trabalhista trouxe uma possibilidade de redução de jornada
e salário de forma proporcional, como instrumento de flexibilização de redução
de custo para proteção do emprego, alternativa que pode ser utilizada nessa
crise mediante acordo escrito.
No
caso de acordo individual, esse deve representar alguma vantagem ao
trabalhador, como seria o caso de reduzir a jornada para o empregado fazer um
curso. Por isso, se a redução for unicamente no intuito de manter o atendimento
à população, como farmácias e mercados, esse acordo pode ser celebrado perante
o sindicato, evitando complicações futuras.
7 – Suspensão do contrato de
trabalho
Sugestão
do Ministro da Economia, Paulo Guedes[1], a suspensão dos contratos
de trabalho poderia ser uma medida adotada para os próximos três ou quatro
meses, nos serviços suspensos, como aéreo, bares, restaurantes e cinemas.
Na
suspensão do contrato, não há pagamento de remuneração, razão pela qual o
Governo estuda outras maneiras de remunerar o trabalhador nesse período.
Caso
a decisão venha do Governo, será em caráter imediato, não necessitando de
negociação coletiva. Todavia, caso seja tomada por parte do empregador,
independentemente da decisão governamental, deverá ser realizada mediante
assistência sindical.
8 – Caso haja a necessidade
de dispensa (demissão) de empregados
Em caso de necessidade de dispensa de empregados, esses
contratos de trabalho, no caso de grandes empresas, podem passar por negociação
coletiva, (embora a reforma trabalhista não exija, a negociação acaba por se
tornar uma proteção aos trabalhadores e até mesmo ao empregador).
A lei n. 13.979 não adentrou o mérito das dispensas,
então pela legislação vigente até o momento não há impedimento de dispensa em
razão da crise, ou até mesmo de infectados. Claro que futuramente os infectados
que forem dispensados poderão ingressar na justiça em busca de algum tipo de
reparação, tal como dano moral ou anulação da dispensa visando reintegração,
panorama que dependerá do posicionamento do Governo nas próximas semanas.
Caso o período de quarentena ou isolamento passe a ser
considerado como período de suspensão do contrato de trabalho, as dispensas
seriam consideradas nulas, ensejando a anulação da dispensa, com consequente
reintegração ou indenização substitutiva.
Se ocorrer das empresas começarem a atrasar pagamentos em
razão da crise, correrão sério risco de rescisão indireta, que é quando o
empregador comete o justo motivo do rompimento contratual em razão da falta de
pagamento dos salários.
9 – Empregados que ganham
por hora/aula
Aos que ganham por hora/aula, como personal trainers e
demais professores, apesar da maioria dos contratos prever que esses
profissionais somente receberão por aula ministrada, o que se pede nesse
momento é o bom senso dos empregadores, haja vista que essas empresas recebem
por contrato mensal, então não deixarão de receber, ainda que as aulas não
sejam ministradas.
Conclusão
Distintamente de outros países, o Brasil não possui uma
legislação específica a ser utilizada em situações de crise, desse modo, a
legislação atual será empregada no que couber, e, no que não couber, será
ponderado o bom senso e a flexibilização de direitos e obrigações.
__________
*Sabrina Soares
Piau, advogada, OAB-DF
41.979, graduada pela Universidade do Distrito Federal-UDF e pós-graduada em
Direito e Processo do Trabalho pela ATAME, Universidade Cândido Mendes,
integrante da diretoria da Comissão de direito do trabalho da OAB-DF no triênio
2016-2018.
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